Conhecimento, verdade, Heidegger e a tradição
Apesar de tudo aquilo que pode ser dito contra o modelo filosófico apresentado por Heidegger em Ser e Tempo – que tem estilo tortuoso, demasiadamente teutônico e etc. – não se pode negar o fato de que tal modelo filosófico acaba trazendo uma rajada de ar fresco aos enigmas
filosóficos tradicionais. Faz isso através de uma profunda mudança paradigmática introduzida pela da analítica existencial do Dasein. Por meio dela o filósofo desenterra os pressupostos ontológicos necessários para cortar o nó górdio da relação sujeito-objeto, ponto de partida das teorias da teorias da consciência e da subjetividade.
A indicação da condição de ser-no-mundo como constitutivo fundamental do Dasein foi, sem dúvida, o elemento essencial que sustentou o confronto como os modelos filosóficos da metafísica clássica. Ser-no-mundo indica o modo de ser/estar do Dasein ocupado em um mundo que lhe é familiar. Enquanto conceito ontológico, “mundo” é a morada do Dasein, não no sentido de um continente onde ele se encontra ao lado de outros entes meramente subsistentes, mas como aquilo onde ele se move, se arranja, se envolve (praticamente) com as coisas que lhe vem ao encontro. Em outras palavras, mundo é uma estrutura que já se encontra desde sempre em operação; uma estrutura que não é fruto de um processo reflexivo, mas que é aquilo onde o Dasein se movimenta numa circularidade da qual não consegue jamais se desvencilhar. Nesse sentido, ser-no-mundo diz muito mais do que o fato do Dasein subsistir em um mundo. O “no” não aponta para um lugar circunscrito; tem antes o caráter de um estar familiarizado com, de um estar em casa, de um habitar.
A condição ser-no-mundo suporta em si o horizonte de um mundo já projetado, feito espontaneamente a partir do comportar-se originário do Dasein. O mundo está dado de modo tão imediato quanto a própria existência. Por isso que o velho e sempre presente problema das teorias do conhecimento tributárias dos paradigmas da subjetividade – a saber: o modo como se realiza a transposição da barreira entre sujeito e mundo – não faz mais sentido. O Dasein já está desde sempre “fora” de si, junto aos objetos do conhecimento e ocupado com eles.
Esse modo de ser junto aos entes, característico do ser-no-mundo, é perpassado por uma compreensão igualmente originária. Não é uma compreensão temática, reflexiva, apoiada em leis e categorias lógicas, mas uma compreensão que está sempre em curso enquanto e na medida em que o Dasein, existindo, se envolve com o mundo. Ela se dá através das projeções existenciais articuladas numa rede de significância que, mantendo-se como fundo, permite o surgimento daquilo que vem ao encontro como coisas determinadas, ou seja, como coisas significativas. Trata-se de um “ver” pré-temático que descobre e libera os entes a partir de sua pertinência ao “mundo familiar” (mundo circundante) do Dasein; um “ver” que, embora não seja temático, acompanha todas as tematizações, enquanto aquilo que as fundamenta. Nessa compreensão radica o ponto de partida de todo o fenômeno do conhecimento. E é nesse sentido que Heidegger dirá que “o conhecer se constitui num modo de ser do Dasein enquanto ser-no-mundo”2. E diz, ainda, que se contra esse achado fenomenal de que “conhecer é um modo ontológico de ser-no-mundo”, surgir a objeção de que tal interpretação aniquila o problema do conhecimento, visto que não deixa nada a questionar, “há de se perguntar que instância decide se e em qual sentido deve haver um problema do conhecimento, a não ser o próprio fenômeno do conhecimento e o modo de ser de quem conhece”3.
O conhecer teórico funda-se previamente no já-ser-junto-ao-mundo no qual o ser do Dasein se constitui de modo essencial.4 Mas esse já-ser-no-mundo não é, de início, contemplativo, no sentido de um simples observar. O ser-no-mundo é marcado pelo lidar prático com os entes que vem ao encontro no mundo. Significa a relação viva com o ambiente concreto que em qualquer tempo já é sempre dado. À esta noção de ser-no-mundo prático que Heidegger vai ligar a questão da transcendentalidade. Assim como Kant, também Heidegger busca as condições de possibilidade do conhecer. Mas mostra-se mais radical que Kant, uma vez que funde o transcendental com a condição histórica e fática do ser-no-mundo. Não resta mais um lugar último e seguro de fundamentação. Ser e Tempo elimina de seu âmbito investigativo a questão teológica, o problema das verdades eternas, do eu transcendental, e, ainda, qualquer outra hipóstase privilegiada além do conhecimento finito. Ser e Tempo opera também a eliminação da idéia de “mundo natural” na filosofia. Não sobra mais, às nossas costas, um mundo sólido, fundador e referente de nossas discussões e teorias sobre ele.
O transcendental histórico que Heidegger propõe pretende ser a solução para o problema da antinomia entre o cartesianismo e o empirismo (universal versus singular) que já Kant buscava superar, mas que, no entanto, manteve-se ainda presente em sua obra.5 Como fundamentar uma teoria do conhecimento fugindo dessa antinomia? De um lado há o problema de se cair num universalismo (idéias inatas) e de outro, de se cair no extremo do psicologismo (estrutura existencial singular). O Dasein de Heidegger pretende ser a solução dessa antinomia singular/universal, na medida em que, no seu modo constitutivo de ser-no-mundo já está sempre em curso, praticamente, uma síntese dessas categorias. No seu mundo prático o Dasein se articula em existenciais. E esses existenciais são os esquemas pelos quais a universalidade atravessa e percorre a singularidade da existência. É precisamente nos esquemas e nas regras da existência concreta que se resolve a questão da antinomia universal/singular.
É justamente por sustentar a idéia do Dasein enquanto o “lugar” onde já sempre está em andamento a síntese, que o filósofo pôde pretender abordar tal antinomia sem cair em um dos seus extremos. Diferentemente do processo kantiano que primeiro estabeleceu um eu transcendental (elemento da universalidade) e um eu empírico (elemento da singularidade) pra depois pensar no modo como se processa a síntese entre ambos, Heidegger já indicou, de antemão, o Dasein como sendo, em seu modo de ser-no-mundo, esta síntese. A síntese já sempre se faz praticamente a partir do comportar-se do Dasein nomundo.6
A indicação do Dasein enquanto síntese remete mais uma vez para o caráter hermenêutico deste ente. Ser hermenêutico significa ser no modo da compreensão de ser. No existencial da compreensão já esta dada a unidade do universal e do singular. Toda vivência é perpassada por uma compreensão. O Dasein já sempre se move numa compreensão de si (singular) e nela está implícita uma compreensão do ser (universal). Não é mais uma racionalidade a priori, uma idéia de subjetividade pura, o ponto de apoio do conhecimento, mas sim a condição prática da existência no mundo. O conhecimento não é primeiramente intelectual, mas operacional.
Nesse contexto que irá emergir a discussão acerca da verdade, no famoso § 44 de Ser e Tempo. Lá, o filósofo vai chamar a atenção para o fato de a tradição não ter nunca explicitado o modo de ser da relação intelecto-coisa sob a qual reside a essência de seu conceito de verdade – a saber: que verdade consiste na “concordância” entre o juízo (proposição) e seu objeto. Se a verdade diz respeito ao nexo entre o conteúdo ideal do juízo e a coisa real sobre a qual se julga, há de se perguntar se, “em seu modo de ser, a concordância é real, ideal, ou nenhuma delas? Como se deve apreender ontologicamente a relação entre o ente ideal e o real simplesmente dado?”7. Assim, o conceito de verdade é criticado pelo mesmo motivo que é criticada a relação sujeito-objeto: por se basear numa relação não esclarecida entre entes de naturezas completamente distintas. Para esclarecer a estrutura da verdade não basta, diz Heidegger, “simplesmente pressupor esse todo relacional, mas é preciso reconduzir o questionamento a seu contexto ontológico que sustenta esse todo como tal”8. Ou seja, o fenômeno da verdade e o modo de ser da relação que nela se opera têm de ser buscado na estrutura existencial do Dasein como ser-no-mundo.
Vista a partir do contexto ontológico-existencial, a verdade não é primariamente propriedade dos juízos, assim como entende a tradição. A análise da proposição revelou sua essência como ser-descobridor. Assim, dizer que uma proposição é verdadeira significa dizer que ela descobre o ente em si mesmo; ela propõe, indica “deixa ver” o ente em seu ser e estar descoberto. O ser-verdadeiro (verdade) da proposição deve ser entendido, então, no sentido de ser-descobridor. Daí a verdade não possuir a estrutura de uma concordância entre conhecimento e objeto, no sentido de uma adequação entre um ente (sujeito) e um outro ente (objeto).
A verdade enquanto descoberta se constitui num modo de ser do Dasein, possível somente com base no ser-no-mundo. “Descobrir é um modo de ser-no-mundo”, dirá Heidegger19. E, sendo assim, aquilo que possibilita esse descobrir em si mesmo deve ser necessariamente considerado “verdadeiro”, num sentido ainda mais originário. Portanto, “os fundamentos ontológico-existenciais do próprio descobrir é que mostram o fenômeno mais originário da verdade”10. Ora, trata-se do já indicado fenômeno da compreensão originária. Todo conhecimento contido nas proposições é o desdobramento desse conhecimento mais originário, pré-temático, que está já sempre em curso a nível existencial.
É a compreensão que abre originalmente o mundo ao Dasein. E, ao fazer isso, não se guia por regras lógicas, mas por um contexto de significação, relevante à ação do Dasein e sempre acessível. A compreensão não é mais, portanto, uma réplica das ciências do espírito, que acompanha a explicação naturalista; ela é própria a uma maneira de existir junto ao ser, anterior ao encontro com os entes particulares. Pode-se dizer que a compreensão originária não compreende entes, enquanto coisas independentes e seus predicados, mas é o próprio ser que nela se apresenta como o sentido que de algum modo tem de se dar para que se possa fazer predicações. Nessa compreensão originária Heidegger situará o fenômeno originário da verdade e o indicará como o fundamento da verdade proposicional. E é nesse sentido que se pode dizer, então, que a verdade encontra-se, justificadamente, num nexo originário com o ser.
Só porque o Dasein em seu modo de ser-no-mundo já esteve sempre junto ao ente e o compreendeu é que é possível, depois, fazer construções temáticas. Com isso Heidegger quer evidenciar a estrutura existencial que sustenta, não apenas a proposição, mas todo o nível apofântico. A proposição não é o lugar da verdade, mas antes, bem entendida, se funda nela, na medida em que ela sempre aponta para a compreensão originária que deve ser primeiramente verdadeira para que o conteúdo proposicional também o seja. A demonstração que faz a proposição se dá com base no que já se abriu na compreensão e descobriu na ocupação cotidiana. A proposição não paira no ar, desligada, a ponto de poder por si mesma abrir pela primeira vez o ente como tal; ela sempre já se detém no ser-no-mundo. O que garante a legitimidade da proposição e o caráter verdadeiro de seu conteúdo tem de ser buscado a partir da explicitação do transcendental (existencial) que sustenta a relação que na proposição é mostrada. Não é um sujeito absoluto, ou um eu transcendental que sustenta esta relação, mas algo que já se deu e continua se dando praticamente, em nível existencial: o envolvimento familiar com o mundo. E familiar no sentido de já compreendido.
Essa nova concepção acerca da proposição possibilitou que Heidegger realizasse uma radical distinção entre verdade fundada (nível apofântico) e verdade fundante (nível existencial). E foi precisamente esse conceito de verdade existencial, que em Heidegger corresponde ao fenômeno mais originário da verdade, que mais escandalizou a tradição filosófica ocidental. Isso porque a tradição sempre pôs na verdade o caráter de necessidade e na existência o caráter da contingência; e Heidegger acaba casando esses elementos contraditórios. O filósofo introduz a historicidade do Dasein para dentro da discussão da verdade e do conhecimento em geral. Não em nível apofântico, mas naquilo que é sua condição. A existência é a condição da verdade dos conteúdos proposicionais. Antes de qualquer subjetividade fundante há uma evidência operando na situação de ser-no-mundo, mesmo que esta evidência seja, na maior parte das vezes, obscurecida pela separação cotidiana entre consciência e mundo.
A metafísica clássica preza ao paradigma das teorias da consciência e da representação e ao modelo da relação sujeito-objeto, não percebeu – e esta é sua falha fundamental – o modo como a proposição e conseqüentemente a verdade proposicional se fundam no modo de ser-no-mundo do Dasein, que é primeiramente operacional e não intelectual. O sentido dos enunciados não emana de seu caráter racional ou de uma espécie de subjetividade a priori, mas é proveniente do mundo ambiente em que o Dasein já sempre é/está. Por não prestar atenção ao fenômeno existencial da compreensão é que a filosofia, há mais de dois milênios, encontra-se envolta com os problemas oriundos de uma teoria do conhecimento baseada na relação sujeito-objeto, sem, contudo, sair do lugar.
Como conseqüência da afirmação fenomenológica de que os fundamentos da verdade são existenciais, resultou a relativização da verdade ao Dasein. Dirá Heidegger: “Só ‘há’ verdade na medida e enquanto o Dasein é”11. E acrescenta em seguida: “Antes do Dasein e depois do Dasein não havia verdade e não haverá verdade porque, nesse caso, a verdade não pode ser enquanto abertura, descoberta e descobrimento”12. A existência é condição de possibilidade da verdade na medida em que é por ela que o mundo se abre originalmente, podendo ser, então, tematizado. No entanto, a afirmação da relativização da verdade ao Dasein não significa, de modo algum, afirmar a verdade como algo subjetivo, no sentido de algo que está no arbítrio do sujeito. Pois, constata Heidegger, “em seu sentido mais próprio, o descobrimento retira a proposição do arbítrio ‘subjetivo’ e leva o Dasein descobridor para o próprio ente”13. E acrescenta, ainda, que também a “validade universal” da verdade enraíza-se simplesmente no fato de que o Dasein pode descobrir e libertar o ente em si mesmo. Somente assim é que esse ente pode em si mesmo se ligar a cada proposição possível, ou seja, à sua própria demonstração.
Na análise acerca do modo de ser da proposição no § 33 de Ser e Tempo o filósofo já enfatizava o caráter definidor da proposição, por meio do qual o ente é apresentado como algo subsistente. Daí a constatação de que na proposição se abre o acesso às propriedades.14 E porque pertence também ao modo de ser da proposição a possibilidade de ser comunicada e retomada pelos outros é que se torna possível, em nível apofântico, a colocação da verdade como concordância de algo (intelecto) com algo (coisa). Ao ser comunicada e retomada, a proposição torna-se também um objeto dado à mão, sendo que a verificação de seu conteúdo apresenta o caráter de uma relação entre coisas, podendo assim haver a concordância. Veja-se Heidegger: “Com o pronunciamento da proposição, a descoberta dos entes se volta para o modo de ser do manual intramundano. Na medida, porém, em que nela, enquanto descoberta de..., se mantém uma remissão a um ser simplesmente dado, a descoberta (verdade), por sua vez, se torna uma relação simplesmente dada entre seres simplesmente dados (intellectus et res)”15. A descoberta originária se converte em propriedade simplesmente dada de proposições, de modo que a verdade enquanto descoberta transforma-se em verdade enquanto concordância entre coisas dadas. E, como isso, fica demonstrado o caráter derivado do conceito tradicional de verdade.
As críticas dispensadas ao conceito tradicional de verdade e a sua indicação como conceito derivado não significam uma rejeição, por parte de Heidegger, de todo o aparato filosófico da metafísica clássica edificada sobre a noção de verdade como “concordância”. Não é a intenção do filósofo jogar fora o conceito tradicional de verdade, mas tão somente expor os fundamentos existências (até então não problematizados) que o sustentam. Claro que a explicitação desses fundamentos trazem outras implicações, como, por exemplo, a afirmação da finitude da verdade. Mas essa é uma conseqüência necessária daquela pretensão inicial de pensar as condições ontológicas existenciais do conhecimento. Uma vez que ficou demonstrado que não se pode prescindir dos pressupostos existenciais que acompanham o conhecimento nas mais diversas áreas, o valor de verdade desses conhecimentos assumem um caráter finito. Se o problema da fundamentação está ligado à existência, então o fundamento não é mais transparente e seguro a ponto de sustentar “verdades absolutas” ou “verdades eternas”.
Parece que a lição principal deixada por Ser e Tempo, no que tange ao problema do conhecimento, é a necessidade de pensá-lo como uma possibilidade existencial relativa ao modo de ser do Dasein e, por isso, limitado; e , por isso, finito.
Marcelo Doro
Mestre em Filosofia - UFSC
Referências Bibliográficas
DAHLSTRON, Daniel O. Heidegger’s concept of truth. Cambridge University Press, 2001.
DREYFUS, Hubert L. Being-in-the-world: a commentary on Heidegger’s Being and Time, division I. Cambridge, Mass.: MIT Press, 1991.
HEIDEGGER, M. El ser y el Tiempo. México: Fondo de Cultura Economica, 1986.
___________. Sein und Zeit. 16 ed. Tübingen: Max Niemeyer, 1986.
___________. Ser e Tempo. 5 ed. Petrópolis: Vozes, 1995.
STEIN, Ernildo. Seminário sobre a Verdade. Petrópolis: Vozes, 1993.
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[1] Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
2 Heidegger, M. Sein und Zeit. 16 ed. Tübingen: Max Niemeyer, 1986, p. 61. Doravante sitado com “SZ”.
3 SZ, p. 61.
4 A analítica existencial revelou como modo de ser essencial do Dasein o cuidado, que engloba a estrutura do preceder-a si-mesmo por já ser e estar em um mundo como ser junto aos entes intramundanos (SZ, p. 192). Essa estrutura salvaguarda a visão unitária do dasein com o mundo e indica a dimensão temporal que o perpassa: o “preceder-a-si-mesmo” remete ao futuro; o “já ser” remete ao passado; e o “ser-no” remete ao tempo presente. Em oposição à metafísica clássica que trabalha com o conceito de tempo linear (objetivado), Heidegger enfatiza a dimensão ecstática da temporalidade do cuidado. Nesse sentido, o tempo não é para ser entendido como um meio pré-existente ao Dasein, como algo que existe previamente e fora dele mesmo. É antes a própria essência do dasein, permanentemente, articulando-se, como futuro, no presente, em pleno bojo do passado. O Dasein é tempo, não está no tempo.
5 A saída oferecida por Kant à antinomia universal/singular (ou cartesianismo versus empirismo) preserva ainda o risco de uma circularidade viciosa, na medida em que, por um lado, seu projeto transcendental ele termina sendo uma espécie de fundamento inconcusso, portanto, uma espécie de cartesianismo, e, por outro lado, pelo lado do tempo e da imaginação, ele pode cair no psicologismo – exatamente o erro que o empirismo faria.
6 Essa discussão do existir como síntese entre “singular” e “universal” foi amplamente desenvolvida por Ernildo Stein em Seminário sobre a verdade (Petrópolis: Vozes, 1993).
7 SZ, p. 216.
8 SZ, p. 216.
9 SZ, p. 220.
10 SZ, p. 220.
11SZ, p. 226.
12SZ, p. 226.
13SZ, p. 227.
14SZ, p. 258. Há de se esclarecer, no entanto, que a proposição mesmo enquanto referência ao ente meramente subsistente, não pode negar a sua proveniência ontológica de uma interpretação compreensiva. A proposição precisa sempre “de uma posição prévia do que se abriu a fim de demonstrá-lo segundo os modos de determinação” (SZ, p. 157). Verifica-se a partir da proposição uma mudança na posição prévia: “Aquilo com que lidava manualmente o fazer, isto é, a execução, torna-se aquilo ‘sobre’ o que a proposição demonstra” (SZ, p. 157). A respeito é pertinente a passagem do § 13 (SZ, p. 61-2) que diz: “É necessário que ocorra previamente uma deficiência do afazer que se ocupa do mundo para se tornar possível o conhecimento, no sentido de determinação observadora de algo simplesmente dado. Abstendo-se de todo produzir, manusear etc., a ocupação se concentra no único modo ainda restante de ser-em, ou seja, no simples fato de demorar-se junto a... (...) Nesse ‘deter-se’ – enquanto abstenção de todo manuseio e utilização – cumpre-se a percepção de um ente simplesmente dado. Esse perceber se realiza no modo de interpretar e discutir algo como algo. A percepção se torna determinação com base nesta interpretação, entendida em sentido amplo. O que se percebe e determina pode ser pronunciado em sentenças e manter-se e preservar-se nessa qualidade de proposto”.
15SZ, p. 225.