Entrevista com Wellington Lima Amorim
Por Luiz Meirelles
Gostaria de dedicar esta entrevista aos congressistas do I CONGRESSO DE CIDADE DE GOIAS/V EU PENSO, que ocorreu na cidade de Goiás Velho, no Estado de Goiás. Que teve como organizadora a Profª Ana Gabriela Colantoni, representando a Universidade Federal de Goiás.
1. Como você vê a situação atual da Filosofia no Brasil?
No Brasil existem apenas professores de Filosofia. Ocupam-se da Filosofia como atividade histórica, exegética, uma verdadeira liturgia de exposição de motivos e conceitos. Estes professores não atentam para o fato de que: “Quem olha para o mundo de modo inteligente, também o mundo olha para ele de modo inteligente” (Hegel). No entanto, o que se observa é uma metodologia estéril que privilegia a biografia dos filósofos, e muito menos se preocupam em analisar a história do espírito, ou o espírito de uma época (zeitgeist), mas sua metodologia leva a uma coleção de anedotas, mesmo que exponham minuciosamente um conjunto de conceitos e dados dos vários pensadores que se ocuparam seriamente no pensamento humano nestes 2500 anos de civilização ocidental.
2. Podemos vislumbrar alguma Filosofia autenticamente brasileira ou pelo menos algum traço característico do filosofar brasileiro?
Toda Filosofia pode ser erótica, às vezes é estéril! Mas todo pensamento orgânico é verdadeiramente pornográfico! A Filosofia namora com o abismo, mas se paralisa diante do medo! Somente o pensamento orgânico se lança no abismo de nossa existência. Por isso, o verdadeiro pensamento esta no ato pornográfico, que pode ser uma força pedagógica capaz nos conduzir ao pensamento do Ser pelo Ser. E preciso se libertar da linguagem, gramática, lógica, coerência, para dar espaço ao originário, poético. Quando nos afastamos do pensamento originário, nos tornamos cada vez mais eróticos e menos pornográficos, estamos decadentemente nos adentrando na Filosofia, e nos afastando da poesis: “Quando o pensamento, saindo de seu elemento, chega ao fim, compensa essa perda, valorizando-se como techne, isto é, instrumento de formação, para se tornar, com isso, atividade acadêmica e, posteriormente, atividade cultural. A Filosofia se vai transformando, aos poucos, numa técnica de explicação pelas últimas causas. Já não se pensa... Ocupa-se de “Filosofia”. (Heidegger). O filosofar no Brasil está na literatura e poesia de Machado de Assis, Cora Coralina, João do Rio, Tobias Barreto, Sérgio Buarque de Holanda, só parar citar alguns nomes. Estes, dentre muitos autores no Brasil, nos levam em direção ao pensamento originariamente brasileiro. São pornográficos, obscenos, estão fora de cena, são ignorados em nossos departamentos de Filosofia. Isto porque eles nos colocam diante da possibilidade de experienciar o instante e o numinoso, o Ser brasileiro, extrapolando os limites da razão instrumental e acadêmica nos colocando no campo da existência no Brasil. Isto se dá porque o filósofo profissional com seu academicismo prostitui o Ser com sua linguagem, sua coerência, lógica. Transforma o pensamento em objeto de barganha, em uma erótica, enfim, ocupa-se com a Filosofia.
3. Após tantos séculos em que os grandes sistemas filosóficos foram sendo contestados e derrubados, ainda seria válido tentar estabelecer algum sistema filosófico de validade universal ou resta mesmo apenas à fragmentação?
Segundo Heidegger: “A metafísica é uma fatalidade única, mas talvez necessária ao Ocidente. A metafísica é uma fatalidade porque, como traço fundamental da história do Ocidente europeu, a humanidade vê-se fadada a assegurar-se no ente. E a nele segurar-se sem que, em momento algum, a metafísica faça a experiência do ser dos entes como dobra de ambos, podendo então questioná-lo e harmonizá-lo em sua verdade. Essa fatalidade a ser pensada na dimensão da história do ser é, contudo, necessária porque o próprio ser apenas pode vir à luz em sua verdade, na diferença resguardada entre ser e ente, e isso quando a diferença ela mesma se dá e acontece com propriedade”. (Heidegger). Em algum momento precisaremos superar o niilismo e o desencantamento em que estamos afundados. Mas me parece que depois das experiências totalitárias do século XX, nenhum pensador consegue mais propor uma nova metafísica, outra metanarrativa para a história humana. Fica a pergunta: Será que “Estamos todos demasiado feridos e decaídos, demasiado fatigados e bárbaros na nossa preguiça para apreciarmos ainda o ofício”. (Cioran)? Chegamos, enfim, ao fim do caminho?
4. Quais as principais vertentes filosóficas atuais que você considera relevantes?
Esta é uma questão muito complexa, visto que pode ter múltiplas respostas possíveis. Mas eu diria, tomando como referência a generalidade e não mais a especificidade, qualquer análise filosófica que capture o espírito deste tempo, deve ser levada a sério. Observo que a corrente mais evidente em nossas discussões contemporâneas estão na desconstrução dos grandes sistemas filosóficos e as consequências do niilismo, seja ele na sua face passiva ou ativa.